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Adolescência: o sistema de recompensa como catalizador de comportamentos e emoções

por Igor Alexandre Capelatto

Adolescência: o sistema de recompensa

como catalizador de comportamentos e emoções.

Igor Alexandre Capelatto1

EBWU

Ângela Mathylde Soares2

EBWU

RESUMO – Existe uma área cerebral chamada Núcleo Accumbens, que é responsável pelo centro de prazer e que atua na função de recompensa. O que é a recompensa senão uma função, um sentimento que causa uma resposta positiva de que ‘valeu a pena exercer todo aquele esforço’. O sistema de recompensa desempenha o papel de dar sentido a todas as atividades que não são prazerosas (como estudar, arrumar a cama, acordar cedo, por exemplo). É como um benefício final. Na adolescência observamos o Núcleo Accumbens em uma relação com as demais funções do Sistema Límbico (uma estrutura que fica abaixo do córtex pré-frontal que é responsável pelas respostas emocionais) atuando em um processo de compensação da perda de massa cinzenta referente ao córtex pré-frontal. Esse artigo propõe uma reflexão sobre porque adolescentes tem determinados comportamentos e como lidarmos com estas condições neuropsíquicas.

Palavras-chave: Adolescência, Núcleo Accumbens, Sistema Límbico, Emoções, Comportamentos, Sistema de Recompensa.

Adolescence: the reward system

as a catalyst for behavior and emotions.

ABSTRACT – There is a brain area called the Accumbens Nucleus, which is responsible for the pleasure center and acts on the reward function. What is reward if not a function, a feeling that causes a positive response that ‘it was worth putting in all that effort’. The reward system plays the role of giving meaning to all activities that are not pleasurable (such as studying, making the bed, waking up early, for example). It’s like a final benefit. In adolescence, we can notice the Accumbens Nucleus in a relationship with the other functions of the Limbic System (a structure that is below the prefrontal cortex that is responsible for emotional responses) acting in a process of compensating for the loss of gray matter related to the prefrontal cortex. front. This article proposes a reflection on why adolescents have certain behaviors and how to deal with these neuropsychic conditions.

Keywords: Adolescence, Nucleus Accumbens, Limbic System, Emotions, Behaviors, Reward System.

INTRODUÇÃO

Nós, seres humanos, temos uma distinção psíquica importante entre o prazer e a exigência. Determinadas funções que devemos realizar por necessidade, que não são de nossas escolhas, como funções básicas de sobrevivência ou tarefas sociais demandadas por outros ou por regras institucionais, nos causam um mal-estar. Por outro lado, aquilo que escolhemos realizar sem ser uma obrigação, nos traz um bem-estar. O que faz com que nosso cérebro decifre uma atividade como boa ou ruim, como prazerosa ou não prazerosa? Temos uma área no cérebro chamada Sistema Límbico – uma estrutura que fica abaixo do córtex pré-frontal que é responsável pelas respostas emocionais. Esta área também é a área associada ao Ego, a instância psíquica onde formulamos nossa identidade, nossa personalidade e, dentre outras características, nossos gostos e desejos.

O termo foi desenvolvido em 1878, pelo anatomista e médico, Paul Broca, que descreve o Ego como “limbo”, ou seja, o limite entre as partes do cérebro, entre o lugar do juízo crítico e o lugar dos instintos. O Sistema Límbico engloba, entre outras funções, das memórias, das emoções e da criatividade. Desta forma, é possível compreender que quando temos que exercer alguma função, nossa mente passa a organizar informações que temos armazenadas sobre essa atividade, e como as emoções estão atuante, o esforço demandado aparentemente fora de uma escolha nossa, faz com que essa atuação seja compreendida como algo que tem a ver conosco (faz parte das nossas escolhas) ou se é apenas uma demanda externa que não combina conosco.

É o que identifico como diferença entre desejo e necessidade, entre satisfação e obrigação. Realizar desejos ou atividades satisfatórias, que trazem sentimento de prazer, são compensatórias por si só. Atividades não prazerosas não são capazes de trazer um sentimento de ‘valeu a pena’, por isso o Sistema Límbico desenvolveu uma área chamada Núcleo Accumbens – “uma interface límbico-motora e tem um papel central nos circuitos de recompensa cerebral” (Neto, 2015, p.11). Quando uma tarefa não agradável deve ser executada, o Núcleo Accumbens atua criando ‘comandos’ que dão a essa atividade uma informação de “não gosto de fazer, mas no final vai valer a pena”. Diante deste panorama, nosso cérebro se organiza entre o fazer ou não fazer. Isso nos faz pensar na tomada de decisões.

Dentro da tomada de decisões, as emoções constituem fatores importantes que influenciam no julgamento e que podem representar benefícios ou prejuízos de todo o processo. Igualmente, o sentimento de recompensa, como o prazer e a satisfação, e a aversão possuem significância na motivação e, consequentemente, na tomada de decisões ao atribuir e moldar os valores . Nos humanos, há o sistema de recompensa cerebral (SRC), o qual é responsável pelo prazer e pela satisfação, bem como pelo aprendizado e condicionamento a determinados comportamentos. Ele possui como principal neurotransmissor a dopamina (DA) e é representado pelas vias mesocorticolímbicas, as quais contam com estruturas como a área tegmental ventral (ATV), o córtex pré-frontal, o hipocampo, o núcleo accumbens (NAc) e a amígdala, demonstrando sua relação e ação nas funções cognitivas e executivas, como nas emoções. A modulação comportamental ocorre pelo aprendizado baseado nas experiências anteriores pelo processo de condicionamento operante, também chamado de aprendizagem instrumental, o qual se baseia no reforço de determinado comportamento por meio de um reforço positivo, quando algo recompensador acontece, ou por reforço negativo, quando um fator aversivo é eliminado. Nos circuitos neuronais, como no SRC, as experiências diárias de tomada de decisões são refletidas por meio de alterações dos padrões de sinais neuronais, os quais operam modelando os valores, sendo eles os sinais de recompensa, quando há entrega da recompensa, ou sinais de erro de previsão de recompensa, quando esta não acontece ou não corresponde à expectativa (Lima, 2022, p. 52.).

Ao buscar aquilo que traz satisfação (que se garante pelo reforço positivo), o nosso cérebro emite uma informação de significância a aquela realização, mesmo que ela por si só não tenha significado para nós. Assim, a recompensa de alguma forma dá um sentido a determinadas realizações não prazerosas. Ao traduzir a atividade não agradável em uma função que leva ao prazer, o ‘preciso fazer porque mandaram’, ‘preciso fazer para sobreviver’ ou a ‘obrigação’, se transfere para o ‘faço para ganhar algo em troca’. “É chato mas compensa”.

A modulação comportamental traz ao cérebro e ao corpo uma sensação a toda estrutura motora e psíquica desta atividade que faz com que a percepção de que ela é desagradável seja amenizada pela expectativa do que vai vir de bom com a recompensa. Um comportamento não prazeroso mas que resulta em um sentimento agradável. Pensamos na criança que não quer comer as verduras e os legumes. Quando ofertamos o chocolate de sobremesa caso ela coma toda a comida, a criança vai lá e come. Quando pensamos no adulto, as férias como recompensa do esforço no trabalho tem essa função de satisfação, por exemplo. Mas e no adolescente?

CAPÍTULO 1

Existe recompensa para os Adolescentes?

1.1 – Entre a função da coisa e o prazer.

Podemos pensar que a viagem nas férias se o adolescente passar na prova é uma recompensa e sim ela é e funciona, no entanto, devemos pensar que o motivador em si ali não é apenas a viagem. É o fato de que é preciso garantir ao adolescente que não será feito aquilo (no caso a prova) em vão. E ainda, é fundamental que o cérebro possa significar, dar uma razão as atividades. O cérebro precisa entender para que serve uma atividade para que ao executá-la faça sentido e não seja desagradável, ou apenas desagradável. Um exemplo simples é o arrumar a cama. Adolescentes costumam falar que arrumar a cama não faz sentido, porque não vão usar a cama arrumada e logo depois, no final o dia irão desarrumá-la novamente. A cama arrumada é para deixar o quarto organizado, é o que lhes é dito, mas a eles não faz sentido algum, pois passarão o dia fora de casa, na escola.

Ao falar da função da coisa, nem sempre essa função é para o adolescente. Vamos pensar em como funciona o cérebro adolescente e assim entender quais são as necessidades dos adolescentes. Esta fase do desenvolvimento humano que costuma ser dos 12 aos 25 anos (considerando o amadurecimento cerebral), é uma fase onde há muitas perdas (da infância), são constantes lutos e onde muita coisa nova surge e é preciso apreendê-las: são mudanças sociais, familiares, na escola, mas são tambpem muitas mudanças fisiológicas, é a fase onde os hormônios atuam com maior intensidade, onde a testosterona começa a transformar os meninos, onde as meninas veem o corpo mudando (o ‘surgimento’ dos seios) e passam pela primeira menstruação, onde a sexualidade começa florar. É uma fase em que a ‘confusão’ é intensa, são muitas dúvidas, incertezas, ansiedade, medo. São cobrados de pensar na vida adulta, escolhas profissionais, estudar para o “vestibular”, enquanto ainda pensam em brincar, nas atividades infantis. Acordam e ainda não sabem o que querem no café da manhã. E isso é dado por essa composição entre produção hormonal e a estruturação plástica do cérebro – nesta fase, o cérebro perde parte da massa cinzenta (figura 1) responsável pelo juízo crítico, pela tomada de decisões. Precisam realizar coisas que lhe dão prazer e não tomar decisões entre funções básicas obrigatórias, para que possam ter algum incentivo, como por exemplo ir à escola – se acordar cedo é difícil, a aula é chata e a prova é ruim, precisam criar alguma razão para ir à escola, o que costuma ser encontrar os amigos e para alguns, uma atividade esportiva.

Figura 1. Crédito: Rodrigo Cunha. Revista Planeta.

    1. O juízo crítico: a tomada de decisão e o outro.

Uma das regiões do cérebro que muda mais radicalmente durante a adolescência é o chamado córtex pré-frontal. Bem, este é um modelo do cérebro humano e este é o cortex pré-frontal, aqui bem na frente. O córtex pré-frontal é uma área interessante do cérebro. Ele é proporcionalmente bem maior nos humanos que em qualquer outra espécie, e está envolvido em uma vasta gama de funções cognitivas de alto nível, tais como tomada de decisões, planejamento, como do que se vai fazer no dia seguinte ou na próxima semana, ou no próximo ano, e inibição de comportamentos inapropriados, como evitar que você diga algo realmente grosseiro ou faça algo realmente idiota. Ele também está relacionado com a interação social, com a compreensão das outras pessoas e a autoconsciência. (Blakemore, 2012)

A área do córtex pré-frontal que tem perda significante na adolescência é responsável pela instância psíquica chamada Superego. “O superego é uma das instâncias do psiquismo que Freud descreveu no conjunto da segunda tópica do aparelho psíquico, exercendo as funções de auto-observação, consciência “moral” e formação dos ideais” (FREUD, 1932). “É por meio dele que o ego se avalia”. (DE MENEZES e STEFANISZEN, 2020, p.54). O superego é responsável pelo juízo crítico, pelas tomadas de decisões e definir o que é certo e errado diante das normas, regras que o mundo apresenta. O que pode e o que não pode. Essas regras portanto vem do mundo externo, de uma instituição ou do outro (de um sujeito que define a regra, como o pai, a mãe ou os professores, por exemplo). Na adolescência, compreender essas regras muitas vezes é angustiante, pois são regras que infringem desejos, prazeres que até então podiam ser realizados (a criança pode, mas você não é mais criança). O sentido da cama arrumada pode existir para a mãe mas não para a maioria dos adolescentes.

Como lidar com a redução do juízo crítico? O que fazer para um adolescente seguir determinada regra? Primeiro é preciso compreender que o Sistema Límbico faz com que o adolescente crie lugares de fuga, nos quais pode transgredir certas regras e se identificar com seus iguais: são as chamadas ‘tribos’, os grupinhos. Ali escolhem gostos culturais, de moda, uma linguagem própria e lugares específicos que serão deles. Ali criam identidades de modo a se sentirem pertencentes. Uma vez que não pertencem mais a esse lugar da infância, ou ainda não pertencem ao mundo adulto. São pequenos para dirigir, ter carro e grandes para brincar. Ali podem criar suas próprias regras. Mas ali não vão realizar as tarefas que a casa demanda (os pais), o cuidar do corpo, da escola e da sociedade. Eis então que nesta fase o sistema de recompensa atua com muito mais intensidade, ao mesmo tempo que a massa cinzenta do cérebro (neurônios) diminui nas funções do córtex pré-frontal, ela aumenta sua atividade elétrica (ganho de axônios, condutores de impulsos elétricos entre os neurônios, chamados de sinapses) na região do Sistema Límbico. Adolescentes tem como função primordial do cérebro as emoções, “por exemplo, as regiões cerebrais que têm a ver com as emoções estão mais desenvolvidas na adolescência que o córtex pré-frontal, que, […] está longe da maturidade” (Blakemore, 2011, p.4), assim sendo, a recompensa é o que regula a emoção e serve de impulso a realizar as funções exigidas pelo mundo externo.

Não se pede a um adolescente para realizar essa ou aquela função. Se diz o que ele vai ganhar realizando. E o ganho tem que ser um ganho que faz jus a adolescência e não a vida adulta. Mal sabem o que querem no café da manhã, muito menos terão a capacidade de pensar que estão indo para escola porque isso vai ser importante para o vestibular, o ENEM e a faculdade, portanto para a vida profissional adulta. Blakemore (ibid.) apresenta em seu estudo que o cérebro adolescente funciona no presente e não no pensar do futuro, é o atual que está em vigor, uma vez que as emoções, para a adolescência, são um sentir do agora. Uma das poucas condições de pensar do futuro, é a expectativa de algo prazeroso que está por vir, pensar no passeio, no cinema, na festinha do final de semana, por exemplo. Por isso a sexta-feira é o melhor dia. E pensar nas férias que irá vir e o que terão de prazer nas férias (viajar, por exemplo). Assim, a recompensa no lugar do prazer se torna motivadora para a execução de tarefas. Na escola, passar na prova é so pretexto para viajar nas férias ou ganhar o presente de Natal que tanto almeja.

Mas e o conteúdo? Essa é uma pergunta que muitos psicólogos, pedagogos, neurologistas, pais e educadores fazem.

    1. O sentido do conteúdo

Sim, o conteúdo, sendo funcional para a vida, para o futuro, é fundamental. Mas não basta memorizar, uma vez que boa parte do conteúdo educacional e de prática (vivência social e profissional) dependem do raciocínio, da elaboração de crítica, pensamento, de argumentação (geografia política, exatas, redação, por exemplo). Para tal, é preciso dar uma logica funcional do conteúdo. Para que serve na prática. Sem a experiência prática, o cérebro adolescente não consegue fazer uma conexão entre o conteúdo e sua funcionalidade. Acaba que o conteúdo se torna apenas um monte de códigos a serem armazenados em um cérebro que não está focado neles, pois tem outras demandas (essas que pontuamos, como a s mudanças fisiológicas do corpo, da mente, das perdas da infância e adequações do novo social e papel na família).

Mas quando o conteúdo não for possível de se colocar neste lugar de prática? Ai que entra a recompensa. Não falo apenas da recompensa da viagem nas férias, por exemplo, mas de pensar estratégias pedagógicas que respeitem e enquadrem neste cérebro adolescente. De manhã as sete horas o cérebro ainda não acordou. O adolescente ainda está sonolento. A memória e o raciocínio ainda não ativaram. É preciso atividades que despertem o corpo, regulem os hormônios (a noite o corpo adolescente produz um excesso de Melatonina e Cortisol, além do aumento do testosterona e estrógeno), e ativem o cérebro – acordar. Se não podem dormir mais horas para compensar, é preciso que o corpo e a mente recebam estímulos para despertar. A maioria dos adolescentes por conta do cronograma escolar, acabam não tendo as horas necessárias de sono, e assim, chegam à escola com sonolência excessiva.

A sonolência diurna excessiva (SDE) aumenta a possibilidade de pior desempenho escolar. Segundo Laberge (2001), Carskadon (2002), Giannotti et al. (2002) e Pin-Arboledas e Alarcón (2007) a privação crônica de sono nos adolescentes produz SDE durante o tempo escolar, diminuindo a atenção, capacidade de concentração e interesse, ao igual que o cansaço e a fadiga acumulados comprometem seu desempenho escolar; além disso, se produz um aumento na sua irritabilidade, maiores níveis de ansiedade e depressão. Pelo contrário, estudantes que dormem entre 7 e 9 horas por noite, com boa qualidade subjetiva de sono, menor grau de sonolência diurna e sono consolidado, sem despertares noturnos, apresentam melhor rendimento escolar. (AZEVEDO, AZEVEDO, PEREIRA e SANTOS, 2020, p.110/111).

O que acontece até o cérebro despertar e reduzir a SDE? A memória, concentração e funções cognitivas estão em stand-by. Até que despertem, a emoção está atuante e até mesmo, diante das funções hormonais, serve como bloqueio da concentração e do cognitivo. É preciso também administrar o que se está sentindo, do mais básico como a raiva de ter acordado cedo e ter de ir à escola como situações angustiantes (como por exemplo, um bullying ou uma agressão verbal ou uma perda).

    1. Amigdala Cerebral: agressividade em conflito

Adolescentes expressam a raiva e para isso estão bem despertos? Sim, pois o cérebro está em atividade com uma outra área chamada Amigdala Cerebral, localizada no Sistema Límbico, responsável pelo sistema emocional e o sistema modulador da memória. É como se ela fosse o processador do Sistema Límbico. É a amígdala que é responsável pela elaboração do medo. E ao mesmo tempo quem provoca a sensação de insatisfação, de desprazer, quando confronta uma função que não tem recompensa. A resposta ao medo, a insatisfação e desprazer é a raiva. “Vale lembrar que a amígdala está associada a emoções, impulsos, agressividade e comportamento instintivo” (Edify Education, 2023), portanto o adolescente irá dar respostas mais pulsionais a tudo que é submetido. E, acrescido à Amigdala, temos o fato de que hormônios que aumental a impulsividade estão crescentes na adolescências e os que provocam bem-estar estão em baixa.“[…] O cérebro adolescente contém níveis mais baixos de serotonina e dopamina, neurotransmissores que proporcionam a sensação de prazer e bem-estar. Isso pode gerar o aumento da agressão, juntamente com níveis mais altos de testosterona, contribuindo para explosões de raiva e comportamento impulsivo”. (Edify Education, 2023).

Eles não têm raiva da escola, dos pais, dos professores. Eles têm é uma necessidade de expor em forma de raiva os sentimentos de perda, o luto, as dificuldades com o novo e essa gama hormonal e de atividades de massa branca – ganho de axônios gerando hiperatividade ao mesmo tempo que reduz a capacidade cognitiva, motora e juízo crítico que serviriam como compensadores. Importante reforçar que “a estimulação da amígdala pode levar a um estado de vigilância ou atenção aumentada, ansiedade e medo” (Espiridião-Antônio, 2008). Ansiedade e medo geram além da raiva, angústia e possível síndrome do pânico, uma inquietude. O corpo inquieto, a mente inquieta, são sintomas da ansiedade, pois a ansiedade faz com o cérebro fique com constantes pensamentos do que vai acontecer, criando possibilidades em torno de situações não prazerosas e traduzindo aquilo que não é prazeroso como perigo. Como uma ameaça ao prazer – a prova é uma ameaça porque se não for bem, pode perder o prazer das férias (pois vai ficar de recuperação) ou o presente que foi ofertado caso ele tirasse nota boa.

CAPÍTULO II

Adolescentes são desatentos?

    1. O cérebro adolescente, a ameaça e os riscos.

O cérebro adolescente, como vimos está em atividades constantes regidas pelo Sistema Límbico. Em adesão a essa função, temos o núcleo pré-mamilar dorsal, que se situa no hipotálamo (elo integrador entre os sistemas endócrino e nervoso), que é responsável por identificar ameaças e se há riscos.

Nosso cérebro está alerta aos perigos e cria uma rede de detecção de ameaças que inclui partes críticas do cérebro, entre elas o hipocampo e a amígdala. É uma coisa boa porque nos manteve vivos. Mas é uma área muito sensível que também pode ser ativada por pequenas coisas. Se eu não chegar no metrô na hora, não vou para a entrevista, não terei emprego, toda a minha carreira vai ficar prejudicada. Temos essa capacidade de imaginar, de prever, e isso nos leva a pensar que coisas ruins podem nos acontecer, embora nunca aconteçam. No entanto, antecipar suas consequências nos preocupa. (Burnett apud Rodríguez, 2021)

A atenção depende do hipocampo, uma outra área cerebral, responsável pela memória de longo prazo, necessária para executar concentração. Porém o acesso do hipocampo na adolescência é restringido pela intensa atividade do hipotálamo. O cérebro quando precisa de um esforço maior para atuar com o hipocampo, sente como uma ameaça ao prazer – é um empenho no âmbito de uma exigência, cobrança e vem acompanhada do medo, do pensamento de que não vai dar conta de realizar. Essas atividades cerebrais provocam esse sentimento: se a coisa é ruim, ou obrigatória não vai dar certo, se tem prazer vai funcionar – como se o adolescente fosse capaz apenas de executar aquilo que gera prazer.

    1. TDAH ou Comportamento Adolescente?

Ao ser cobrado de executar uma atividade ‘não prazerosa’ e que demanda atenção, como prestar atenção na sala de aula, na lousa, na fala do professor, o cérebro busca uma fuga, um alívio. A distração nem sempre é um TDAH – transtorno neurobiológico de causas genéticas, caracterizado por sintomas como falta de atenção, inquietação e impulsividade (Associação Brasileira do Déficit de Atenção apud Biblioteca Virtual em Saúde – Ministério da Saúde, 2024) – mas muitas vezes essa defesa contra aquilo que é ‘chato’. Se lhe é dito que haverá recompensa ele busca a concentração ativando o hipocampo, pois o quanto antes executar tal tarefa, antes terá ou garantirá a recompensa. Se não há recompensa, o cérebro cria uma válvula de escape, desvia a concentração para algo que alivie a tenção ou dê prazer – ficar pensando em algo que gosta, conversar com o colga da carteira ao lado, mexer no celular (as redes sociais provocam uma suposta sensação de prazer, com vídeos engraçados, trechos de filmes e séries, clipes musicais etc.). Esse comportamento dito como comportamento adolescente pode ser pensado como um comportamento contra a falta de estímulos adequados à adolescência. Durante a pesquisa que resultou no meu livro “O adolescente na virtualidade da psicanálise” (2023), observei que muitas vezes o adolescente é visto ou como criança ou como adulto, mas não como adolescente – adolescência não é apenas uma ponte da infância para a vida adulta, mas uma fase importante do desenvolvimento humano. E como visto, acima, tem suas importantes particularidades. Assim é preciso, para falar com so adolescentes, “falar na linguagem dos adolescentes”. Quando se sentirem pertencentes em um espaço que seja o espaço do adolescer (em casa, na escola) e então concentrar (prestar atenção) será algo muito mais natural. Pois o ambiente e as relações serão parte da recompensa.

CONSIDERAÇÕES FINAIS:

Pensar na recompensa ao adolescente parece ser algo que traz uma ideia de que ele nõa fará nada porque é preciso fazer, mas sempre porque terá um ganho final. Se o cérebro funciona assim e esta é a natureza, cabe aos pais, educadores e profissionais da saúde mental pensar maneiras de criar situações favoráveis as atividades demandadas. A recompensa para o adolescente está no lugar de um prazer que compensa o esforço, mas podemos perceber que só é esforço porque não tem o lugar do lúdico. O lúdico n[ao é somente a função do brincar, do jogar, das artes, colocada na educação infantil como ferramenta pedagógica, o luto é “o que faz por gosto” (Sampaio, 2009) e talvez o que falte para a adolescência tanto em casa como principalmente na escola é pensar qual é o lúdico da adolescência. E pensar a neurologia e psiquê, funcionamento do cérebro e mente do adolescente e as funções biológicas denominadas pelos hormônios é importante para distinguir o que é um comportamento dito “rebelde” de um comportamento natural desta fase. Ara entender como o adolescente atua no despertar, nas tomadas de decisões, nos desejos, como o adolescente aprende, como se relaciona, a formação da linguagem na adolescência, enfim como é o adolescente.

Referências Bibliográficas:

Associação Brasileira do Déficit de Atenção apud Biblioteca Virtual em Saúde, Ministério da Saúde, acesso em 07/08/24 – in: https://bvsms.saude.gov.br/

AZEVEDO, D., AZEVEDO, N., PEREIRA, F. e SANTOS, J. Sono, aprendizagem e desempenho escolar em adolescentes: possibilidades de intervenção desde a saúde e a educação, 2020, p.110/111

BLACKMORE, Sarah-Jayne. É possível mudar o cérebro dos adolescentes. O que é bom e mau. Entrevista. Site do jornal Público. Portugal, 2010. In: https://www.publico.pt/2017/12/10/sociedade/entrevista/e-possivel-mudar-o-cerebro-dos-adolescentes-o-que-e-bom-e-mau-ao-mesmo-tempo-1791640.

BLACKMORE, Sarah-Jayne. The Adolescent Brain. Edge Foundation. EUA, 2012. In:https://www.edge.org/conversation/sarah_jayne_blakemore-the-adolescent-brain

BURNETT, Dean apud Rodríguez, Margarita. Porque cérebro às vezes atua como inimigo. BBC News Brasil, 2021. in: https://www.bbc.com/portuguese/geral-57525439

DE MENEZES, L. S. e STEFANISZEN, V. (2020); Traçando os possíveis contornos do superego na perversão. Boletim Formação em Psicanálise, v. 28, n. 1, p. 42-69.

ESPERIDIÃO-ANTONIO, Vanderson et al. Neurobiologia das emoções. Archives of Clinical Psychiatry (São Paulo), v. 35, 2008.

FREUD, Sigmund. (1932). Novas conferências introdutórias sobre psicanálise e outros trabalhos. In Novas conferências introdutórias sobre psicanálise e outros trabalhos. Rio de Janeiro: Imago, 1936.

LIMA, José Carlos Souza. Neurobiologia do Sistema de Recompensa Cerebral. Editor Chefe, p. 52.

NETO, Lia Pereira Lucas. Núcleo accumbens humano: da anatomia à imagiologia e clínica. Universidade de Lisboa, 2015.

SAMPAIO, Claudia Dias. Educação com prazer. Revista Educação Pública. 2009. in: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/9/8/educaccedilatildeo-com-prazer.

1 Autor – Pesquisador da Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Estudos da Linguagem, Programa de Linguística, Professor do CEFAS (Centro de Formação e Assistência à Saúde) e Pesquisador do Instituto Shakespeare do Brasil.

2 Orientação e Revisão – Professora e Orientadora da Emil Brunner World University, programa de Pós-Doc, Programa de Neurociências. E-mail: draangelamathyldesoares@gmail.com

Revision List

#1 on 2024-set-09 seg  09:11+-10800

#2 on 2024-set-09 seg  09:08+-10800

#3 on 2024-set-09 seg  09:18+-10800

#4 on 2024-ago-23 sex  08:33+-10800

#5 on 2024-ago-23 sex  08:40+-10800

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