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Drª Aline Barcellos Lopes Plácido
Drª Luciana Cruz de Freitas
lopesplacidonpp@gmail.com
pedagogico.luciana@gmail.com
A importância da Educação Parental de pessoas com Transtornos
do Neurodesenvolvimento e Dificuldades de Aprendizagem
Resumo
Este artigo discute a importância da educação parental no contexto de crianças e
adolescentes com Transtornos do Neurodesenvolvimento (TND) e dificuldades de
aprendizagem, enfatizando sua relevância como estratégia preventiva e interventiva
diante do fracasso escolar. A literatura nacional evidencia que o insucesso escolar é
frequentemente atribuído a diagnósticos como TDAH ou TEA, quando, em muitos
casos, está associado a fatores emocionais e familiares, como conflitos, negligência
e ausência de rotina estruturada (COUTO, 2011; SANTOS et al., 2019; POZZOBON,
2017; UNICEF, 2022). Pesquisas recentes reforçam que a orientação parental pode
favorecer tanto o bem-estar das crianças quanto seu rendimento acadêmico, ao
fortalecer práticas educativas positivas no ambiente familiar (SANTOS, 2023;
ABRAHÃO et al., 2024; DAMASCENO, 2024). Considera-se ainda que a percepção
dos pais sobre as dificuldades de aprendizagem tem impacto direto no engajamento
escolar e na procura de apoios adequados (SANTOS et al., 2025). Conclui-se que a
educação parental, articulada à escola e a políticas públicas inclusivas, constitui
ferramenta essencial para a promoção do desenvolvimento integral, a redução da
medicalização e a construção de estratégias de enfrentamento mais efetivas frente
às dificuldades de aprendizagem e aos TND.
Palavras-chave: Educação parental. Transtornos do Neurodesenvolvimento.
Dificuldades de aprendizagem. Família. Fracasso escolar.
Introdução
O fracasso escolar, compreendido como a dificuldade persistente de crianças e
adolescentes em alcançar os objetivos de aprendizagem esperados, permanece
como um dos grandes desafios da educação brasileira. Historicamente, esse
fenômeno tem sido objeto de intensos debates acadêmicos e sociais. Patto (1990),
em sua obra clássica A produção do fracasso escolar, demonstrou que a escola
brasileira não apenas reflete as desigualdades sociais, mas também as reproduz,
responsabilizando o aluno por dificuldades que, muitas vezes, estão enraizadas em
questões institucionais e familiares. De forma complementar, Charlot (2000)
argumenta que o fracasso escolar não pode ser entendido de forma isolada, mas
como resultado de múltiplas interações entre sujeito, escola, família e sociedade.
Ao longo das últimas décadas, observou-se um deslocamento das explicações para
o insucesso escolar, com crescente ênfase em diagnósticos clínicos. Transtornos do
neurodesenvolvimento (TND), como o Transtorno do Déficit de Atenção e
Hiperatividade (TDAH) e o Transtorno do Espectro Autista (TEA), bem como
dificuldades específicas de aprendizagem, como a dislexia, passaram a ocupar
espaço central nas discussões escolares e familiares. Essa tendência resultou em
aumento expressivo de encaminhamentos a neurologistas, psiquiatras e psicólogos,
muitas vezes acompanhados da prescrição de medicamentos como resposta
imediata (UNIPAMPA/UFSM, 2024). Embora seja inegável a importância dos
diagnósticos clínicos e das intervenções especializadas, autores como Couto (2011)
e Pozzobon (2017) alertam para o risco de reduzir o fracasso escolar a questões
biomédicas, invisibilizando os fatores emocionais, familiares e sociais que o
atravessam.
Estudos nacionais recentes reforçam essa preocupação. Santos et al. (2019)
identificaram, em narrativas de familiares, uma tendência a atribuir o baixo
rendimento exclusivamente à criança ou à escola, minimizando a influência de
conflitos familiares, ausência de rotina ou negligência. O relatório do
UNICEF/CENPEC (2022) também destaca a cultura da medicalização, que
transforma o sofrimento escolar em patologia individual, sem enfrentar as
desigualdades socioeconômicas, os conflitos familiares ou a falta de apoio parental.
Além da medicalização, é necessário reconhecer que o fracasso escolar se
manifesta de forma mais intensa em contextos de vulnerabilidade social. Crianças
que vivem em famílias numerosas, em lares marcados por brigas constantes ou em
situações de alienação parental estão mais expostas a dificuldades emocionais que
repercutem diretamente no processo de aprendizagem. Da mesma forma, a
ausência de acompanhamento familiar estruturado — expressa, por exemplo, em
longos períodos em que crianças e adolescentes permanecem sozinhos em casa —
compromete o vínculo com a escola e enfraquece o desenvolvimento
socioemocional.
Nesse cenário, a educação parental emerge como estratégia promissora. Ao orientar
e apoiar pais e responsáveis, a educação parental fortalece a corresponsabilidade
familiar pela aprendizagem e pela saúde emocional dos filhos. Pesquisas recentes
demonstram que programas estruturados de orientação parental podem melhorar o
bem-estar psicológico, favorecer a socialização e impactar positivamente o
rendimento escolar de crianças com TND e dificuldades de aprendizagem (SANTOS,
2023; DAMASCENO, 2024; ABRAHÃO et al., 2024; SANTOS et al., 2025).
Dessa forma, este artigo tem como objetivo analisar a importância da educação
parental no enfrentamento do fracasso escolar, considerando tanto os aspectos
clínicos quanto emocionais e familiares. Busca-se evidenciar que o insucesso
escolar não se explica apenas por fatores intrínsecos à criança, mas emerge de uma
rede complexa de relações entre escola, família e sociedade. Ao valorizar a
educação parental, pretende-se oferecer subsídios para a construção de práticas
inclusivas e não medicalizantes, capazes de promover o desenvolvimento integral e
a permanência dos estudantes na escola.
2. Marco conceitual e normativo da educação parental
A educação parental pode ser definida como o processo sistemático de orientação,
apoio e capacitação de pais ou responsáveis, de modo a favorecer práticas
educativas consistentes e positivas no âmbito familiar. Diferentemente de
intervenções terapêuticas voltadas diretamente à criança, a educação parental
centra-se nos adultos responsáveis, reconhecendo a família como núcleo de
socialização primária e espaço decisivo para a constituição da subjetividade, do
comportamento e do engajamento escolar.
Do ponto de vista conceitual, pesquisas recentes evidenciam que práticas parentais
de qualidade estão fortemente associadas ao bem-estar socioemocional e ao
desempenho acadêmico das crianças, incluindo aquelas com Transtornos do
Neurodesenvolvimento (TND) ou dificuldades específicas de aprendizagem.
Programas de orientação parental, como o Promove-Pais (ABRAHÃO et al., 2024),
têm demonstrado impacto positivo na redução de comportamentos disfuncionais, na
melhora da autoestima e no fortalecimento da relação entre família e escola.
Estudos como os de Santos (2023), voltados para famílias de crianças com dislexia,
e de Damasceno (2024), em contexto de Transtorno do Espectro Autista (TEA),
reforçam que o envolvimento ativo dos pais constitui fator protetivo contra o fracasso
escolar, justamente porque oferece estabilidade emocional e suporte estruturado às
demandas educacionais.
A relevância da educação parental também encontra respaldo no campo jurídico e
normativo. A Constituição Federal de 1988 estabelece, em seu artigo 205, que a
educação é dever do Estado e da família, devendo ser promovida em colaboração
com a sociedade para garantir o pleno desenvolvimento da pessoa, o exercício da
cidadania e a qualificação para o trabalho. Tal princípio é reforçado pelo Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA – Lei nº 8.069/1990), que, em seus artigos 4º e 22,
atribui à família a responsabilidade de assegurar, com absoluta prioridade, a
efetivação dos direitos fundamentais, incluindo o acesso à educação, e explicita o
dever dos pais em sustentar, guardar e educar seus filhos.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB – Lei nº 9.394/1996) amplia
essa perspectiva ao reconhecer, em seu artigo 2º, que a educação não se restringe
ao espaço escolar, mas abrange processos formativos desenvolvidos no seio
familiar, nas relações sociais e no trabalho. Esse entendimento reforça que a
aprendizagem não pode ser vista como responsabilidade exclusiva da escola, mas
como resultado de uma rede de interações, na qual a família ocupa posição
estruturante.
No campo da inclusão, a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (LBI –
Lei nº 13.146/2015) destaca que a promoção da igualdade de oportunidades exige
articulação entre escola, serviços especializados e família. Nesse contexto, a
educação parental configura-se como recurso estratégico para que pais
compreendam as especificidades de filhos com TND ou dificuldades de
aprendizagem, assumindo papel ativo no processo de inclusão.
Adicionalmente, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC, 2017) traz
competências que só podem ser efetivamente desenvolvidas quando há
corresponsabilidade familiar. Destacam-se, por exemplo, a Competência 6, que
aborda a construção do projeto de vida e a autonomia do estudante, e a
Competência 10, que trata da responsabilidade e da cidadania. Ambas exigem
práticas familiares que favoreçam diálogo, estímulo à autonomia e suporte
emocional, mostrando que a escola sozinha não é capaz de assegurar tais
aprendizagens.
Apesar desses avanços conceituais e normativos, a realidade educacional brasileira
ainda evidencia uma tendência de delegar integralmente à escola — ou, em
situações de dificuldades persistentes, aos serviços de saúde — a responsabilidade
pela aprendizagem. Esse movimento ignora que a ausência de acompanhamento
parental consistente pode agravar problemas escolares, resultando em baixa
autoestima, desmotivação e evasão. Em muitos casos, a busca por diagnósticos
clínicos acaba funcionando como estratégia de transferência da responsabilidade,
quando o real desafio está em fortalecer práticas educativas no ambiente familiar.
Dessa forma, a educação parental deve ser compreendida não como um recurso
opcional, mas como um direito das crianças e adolescentes e um dever
inalienável da família. A valorização desse campo implica reconhecer que a escola
e os profissionais de saúde desempenham papéis fundamentais, mas não
substituem a função formadora da família. Investir em programas de educação
parental significa enfrentar, de modo preventivo, as causas emocionais e relacionais
do fracasso escolar, reduzir a medicalização excessiva e construir uma rede de
apoio que assegure o desenvolvimento integral dos estudantes.
Além dos dispositivos já mencionados, destaca-se também o Plano Nacional de
Educação (PNE – Lei nº 13.005/2014), que em sua Meta 4 prevê a universalização
do acesso à educação básica e ao atendimento especializado, reforçando o
compromisso de que esse processo deve ocorrer em colaboração com as famílias.
Entretanto, observa-se que, na prática, a dimensão parental ainda é pouco
contemplada como parte da execução das metas do PNE, permanecendo um
desafio a ser enfrentado pelas políticas públicas educacionais.
3. O fracasso escolar e a busca familiar por respostas
clínicas
O fracasso escolar, compreendido como a dificuldade persistente em alcançar os
objetivos de aprendizagem estabelecidos pela escola, tem sido, ao longo das últimas
décadas, associado a explicações predominantemente clínicas. Quando crianças ou
adolescentes apresentam baixo rendimento, desatenção ou dificuldades de
comportamento, é comum que as famílias busquem respostas em diagnósticos
médicos ou psicológicos, em especial aqueles vinculados aos Transtornos do
Neurodesenvolvimento (TND), como o Transtorno de Déficit de Atenção e
Hiperatividade (TDAH) e o Transtorno do Espectro Autista (TEA), ou às dificuldades
específicas de aprendizagem, como a dislexia.
Essa tendência revela um fenômeno social mais amplo: a medicalização do
fracasso escolar, que converte problemas de ordem emocional, relacional ou
pedagógica em categorias diagnósticas, frequentemente legitimando intervenções
centradas no indivíduo em detrimento da análise do contexto. Couto (2011), a partir
de sua prática clínica, aponta que muitos casos de baixo rendimento escolar estão
diretamente associados à negligência, conflitos familiares, ausência de rotina ou
alienação parental, mas, por serem fatores difíceis de assumir, são frequentemente
encobertos por explicações biomédicas.
Santos et al. (2019), ao analisar narrativas de familiares, identificaram que os pais
tendem a deslocar a responsabilidade pelo insucesso escolar para a criança ou para
a escola, raramente reconhecendo o impacto das dinâmicas familiares. Esse
processo gera um círculo vicioso: a busca por diagnósticos clínicos alivia a culpa
parental, mas invisibiliza fatores cotidianos que sustentam as dificuldades. Pozzobon
(2017) acrescenta que, ao reforçar percepções individualizantes, a cultura escolar
contribui para legitimar o fracasso como responsabilidade exclusiva do aluno,
reproduzindo a lógica excludente da culpabilização.
O relatório do UNICEF/CENPEC (2022) alerta para o risco dessa perspectiva
reducionista, ao mostrar que o fracasso escolar é atravessado por múltiplas
variáveis, incluindo desigualdades socioeconômicas, falta de apoio emocional e
contextos de violência doméstica. No entanto, a prevalência de encaminhamentos
clínicos sugere que tanto a escola quanto as famílias recorrem a essa via como
explicação rápida e socialmente aceitável. De maneira semelhante, estudo da
UNIPAMPA/UFSM (2024) evidencia que sintomas de ansiedade escolar têm sido
confundidos com TDAH, levando a diagnósticos precipitados e à prescrição de
medicamentos sem a devida investigação de fatores familiares e emocionais.
Esse movimento de terceirização da responsabilidade educativa evidencia uma
lacuna cultural: a dificuldade das famílias em reconhecer que a educação exige
acompanhamento cotidiano, diálogo e presença ativa. Crianças que permanecem
longos períodos sozinhas, sem supervisão ou apoio afetivo, tendem a apresentar
baixa motivação acadêmica, dificuldades de autorregulação e sentimentos de
insegurança, fatores que se refletem diretamente no desempenho escolar. Ao
priorizar explicações clínicas em detrimento de análises relacionais, corre-se o risco
de perpetuar um modelo em que as causas estruturais do fracasso permanecem
inalteradas.
Portanto, mais do que negar a importância da clínica — indispensável em muitos
contextos —, torna-se necessário problematizar o uso indiscriminado desse recurso
como única resposta. O desafio contemporâneo consiste em equilibrar o necessário
diagnóstico diferencial com a análise das condições emocionais e familiares,
reconhecendo que o fracasso escolar é um fenômeno multifacetado que não pode
ser resolvido apenas pelo viés clínico.
Cabe destacar, ainda, o papel das escolas particulares e dos convênios médicos
nesse movimento de medicalização. Frequentemente, exigem laudos diagnósticos
para justificar adaptações pedagógicas ou concessão de benefícios, pressionando
as famílias a buscar respostas clínicas mesmo quando as dificuldades poderiam ser
melhor compreendidas e enfrentadas no âmbito pedagógico e familiar. Essa prática,
além de reforçar a ideia de que apenas um diagnóstico legitima a necessidade de
apoio, contribui para a patologização precoce de crianças e adolescentes.
4. Educação parental como alternativa ao fracasso
escolar
A busca quase automática por respostas clínicas diante do fracasso escolar, embora
legítima em determinados contextos, acaba por invisibilizar um dos fatores centrais
do processo educativo: o papel da família. A literatura nacional e internacional tem
destacado que o ambiente doméstico exerce influência direta tanto no rendimento
acadêmico quanto no bem-estar socioemocional de crianças e adolescentes
(SANTOS, 2023; ABRAHÃO et al., 2024; DAMASCENO, 2024). Nesse sentido, a
educação parental apresenta-se como alternativa estratégica, deslocando o foco
das explicações medicalizantes para a corresponsabilidade das famílias no processo
de escolarização.
A educação parental pode ser compreendida como o conjunto de práticas
sistemáticas de orientação e apoio oferecidas aos pais e responsáveis, de modo a
capacitá-los para lidar com as demandas do desenvolvimento infantil e adolescente.
Diferentemente de intervenções que se concentram exclusivamente na criança,
programas de educação parental reconhecem que o êxito escolar depende da
construção de um ambiente familiar que forneça suporte emocional, disciplina
positiva, rotina estruturada e estímulo intelectual.
Estudos empíricos recentes confirmam a relevância dessa abordagem. Santos
(2023), em pesquisa sobre crianças com dislexia, evidenciou que a participação
ativa da família em programas de orientação parental favoreceu melhorias no
bem-estar subjetivo, na autoestima acadêmica e no desempenho em leitura.
Damasceno (2024), ao revisar intervenções parentais no contexto do Transtorno do
Espectro Autista (TEA), demonstrou que pais orientados sobre práticas educativas
adequadas ampliaram significativamente a socialização e a comunicação dos filhos,
com reflexos positivos no rendimento escolar. Abrahão et al. (2024), por sua vez, ao
avaliar o programa Promove-Pais, identificaram mudanças substanciais nas práticas
educativas domésticas, com impacto direto na redução de
comportamentos-problema e na ampliação do repertório de habilidades das
crianças.
A percepção parental também constitui elemento decisivo. Santos et al. (2025)
verificaram que, quando mães e pais reconhecem as dificuldades de aprendizagem
de seus filhos sem estigmatizá-los, estabelecendo expectativas realistas e
oferecendo apoio afetivo, os estudantes apresentam maior resiliência acadêmica.
Por outro lado, quando prevalecem crenças negativas ou rótulos depreciativos,
como considerar o filho “incapaz” ou “desinteressado”, o fracasso tende a se
perpetuar. Assim, não se trata apenas de instruir tecnicamente os pais, mas de
promover uma mudança cultural, em que a família se reconheça como agente ativo
e corresponsável pela aprendizagem.
A relevância da educação parental torna-se ainda mais evidente diante da
fragilidade das respostas institucionais. O Atendimento Educacional Especializado
(AEE), na forma como está configurado, concentra-se quase exclusivamente em
alunos com deficiência, deixando de fora aqueles cujo fracasso escolar está
relacionado a fatores emocionais ou familiares. Nesses casos, programas de
orientação parental poderiam preencher a lacuna existente, fornecendo ferramentas
para que os responsáveis compreendam a importância de supervisionar tarefas
escolares, criar rotinas de estudo e favorecer interações afetivas que sustentem o
desenvolvimento.
A educação parental, portanto, não deve ser compreendida como complemento
opcional, mas como estratégia preventiva e interventiva essencial. Ao fortalecer
as famílias, contribui para reduzir a medicalização excessiva, melhorar a relação
escola-família e criar condições mais favoráveis para que crianças e adolescentes
com TND ou dificuldades de aprendizagem superem obstáculos e alcancem seu
potencial.
5. Limitações do AEE diante dos casos de fracasso
escolar associado a fatores familiares
O Atendimento Educacional Especializado (AEE), previsto na Política Nacional de
Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (MEC, 2008) e
regulamentado pelo Decreto nº 10.502/2020, constitui-se em política pública de
grande relevância para garantir acessibilidade curricular e apoio pedagógico a
estudantes público-alvo da Educação Especial: pessoas com deficiência, alunos
com Transtorno do Espectro Autista (TEA) e estudantes com altas
habilidades/superdotação. No entanto, embora sua contribuição seja inegável,
observa-se que o AEE apresenta limitações significativas quando o fracasso escolar
se relaciona a fatores emocionais e familiares, os quais não se enquadram nos
critérios formais estabelecidos pela legislação.
Na prática, crianças e adolescentes em situação de negligência, alienação parental,
violência doméstica ou ausência de suporte afetivo permanecem à margem dos
serviços de apoio especializados. A escola, ao não encontrar respaldo legal para
encaminhá-los ao AEE, tende a classificá-los como casos de indisciplina,
desmotivação ou desinteresse, reforçando rótulos que, em vez de solucionar,
intensificam o ciclo de exclusão. Como resultado, esses estudantes acabam
invisibilizados: não encontram acolhimento na sala regular, tampouco nos serviços
especializados, permanecendo em um limbo educacional.
Essa restrição é agravada por uma cultura escolar fortemente marcada pelo
encaminhamento clínico. Quando há suspeita de dificuldades persistentes, a
primeira resposta da escola costuma ser a indicação para avaliação psicológica ou
médica. Entretanto, se o laudo não enquadra o aluno como público-alvo do AEE,
não há suporte pedagógico consistente após o retorno. Essa lógica diagnóstica
transforma o direito ao apoio em privilégio condicionado à existência de um
documento clínico, desconsiderando o impacto das condições emocionais e
familiares sobre a aprendizagem.
A crítica a esse modelo já foi apontada por relatórios institucionais. O UNICEF e o
CENPEC (2022) alertam que a ênfase na medicalização invisibiliza fatores
estruturais, como desigualdades sociais, ausência de rotinas domésticas e conflitos
familiares, que influenciam diretamente no rendimento escolar. Da mesma forma,
estudos recentes (SANTOS et al., 2019; POZZOBON, 2017) demonstram que, nas
narrativas de pais e professores, os problemas familiares raramente são
reconhecidos como causas do fracasso escolar, sendo deslocados para explicações
individuais ou biomédicas.
Repensar o papel do AEE nesse cenário significa ampliar sua concepção. Em vez
de funcionar apenas como espaço de atendimento condicionado a diagnósticos, o
AEE poderia ser reposicionado como instância articuladora entre escola e
família, reconhecendo que as barreiras à aprendizagem não se restringem às
deficiências ou transtornos formais, mas também emergem de contextos
socioemocionais. Tal ampliação não exige negar o foco atual da política, mas incluir
estratégias complementares que deem visibilidade aos estudantes em situação de
vulnerabilidade familiar.
Nesse sentido, a articulação entre AEE e programas de educação parental surge
como proposta inovadora. O AEE poderia assumir a função de orientar famílias
sobre práticas educativas, estabelecer rotinas de estudo em casa e fortalecer
vínculos afetivos, em parceria com serviços comunitários e de saúde. Essa
integração ampliaria sua capacidade de intervenção, deslocando-o de uma lógica
exclusivamente compensatória para uma lógica preventiva e colaborativa.
Portanto, ao limitar seu alcance apenas aos casos formalmente diagnosticados, o
AEE corre o risco de perpetuar a exclusão de uma parcela significativa dos
estudantes que vivenciam fracasso escolar associado a fatores emocionais e
familiares. Superar essa limitação implica reconhecer a complexidade do fenômeno,
reformular políticas públicas e assumir que a corresponsabilidade pela
aprendizagem envolve, necessariamente, escola, família e serviços de apoio
intersetoriais.
Essa limitação não decorre apenas da prática cotidiana das escolas, mas também
de uma orientação normativa. O Parecer CNE/CEB nº 13/2009, que define diretrizes
operacionais para o Atendimento Educacional Especializado, enfatiza
majoritariamente a atenção a estudantes com deficiência, não contemplando de
maneira explícita situações de vulnerabilidade emocional ou familiar. Isso reforça a
necessidade de revisão das políticas para que contemplem a complexidade das
demandas presentes no cotidiano escolar, ampliando o olhar para além da lógica
diagnóstica.
6. Considerações finais
O fracasso escolar, historicamente tratado como responsabilidade individual do
estudante ou como falha intrínseca de sua capacidade cognitiva, precisa ser
compreendido a partir de uma perspectiva ampliada. As evidências analisadas neste
estudo demonstram que, para além das dificuldades de aprendizagem e dos
Transtornos do Neurodesenvolvimento (TND), fatores emocionais e familiares
desempenham papel central na determinação do sucesso ou do insucesso escolar.
Conflitos constantes no lar, ausência de rotinas estruturadas, negligência parental e
práticas educativas inconsistentes configuram-se como barreiras invisíveis que
impactam diretamente a motivação, a autoestima e o rendimento acadêmico.
A busca frequente por respostas clínicas – seja por diagnósticos médicos ou
psicológicos – revela uma tendência de medicalizar problemas que, em muitos
casos, têm raízes na dinâmica familiar. Essa medicalização excessiva, ao mesmo
tempo em que oferece explicações rápidas e socialmente aceitas, corre o risco de
invisibilizar questões estruturais que exigem enfrentamento coletivo e intersetorial. O
desafio consiste, portanto, em equilibrar a importância das avaliações clínicas com a
necessidade de reconhecer e intervir sobre os contextos socioemocionais que
atravessam a vida de crianças e adolescentes.
Nesse cenário, a educação parental assume papel estratégico. Orientar e capacitar
famílias para que desempenhem, de forma consciente e consistente, sua função
educativa constitui medida preventiva e interventiva contra o fracasso escolar.
Pesquisas nacionais recentes reforçam que programas de orientação parental
produzem impactos positivos tanto no comportamento infantil quanto no rendimento
acadêmico, confirmando que a corresponsabilidade da família é insubstituível no
processo formativo.
Por outro lado, a análise também revelou limitações institucionais significativas, em
especial no que diz respeito ao Atendimento Educacional Especializado (AEE). Ao
restringir-se quase exclusivamente ao público formalmente definido pela legislação –
pessoas com deficiência, alunos com TEA e estudantes com altas
habilidades/superdotação –, o AEE deixa de atender situações de vulnerabilidade
socioemocional que geram fracasso escolar. Essa lacuna contribui para a
manutenção de práticas excludentes e reforça a invisibilidade de estudantes que,
embora não apresentem laudos clínicos, vivem sob condições familiares adversas
que comprometem sua aprendizagem.
Assim, enfrentar o fracasso escolar requer uma mudança de paradigma. É
necessário deslocar o foco da criança isoladamente considerada para uma
abordagem sistêmica, que integre escola, família, serviços de saúde e comunidade.
A educação parental deve ser incorporada como política pública estruturante,
articulada ao currículo escolar e aos programas de apoio, de modo a reduzir a
medicalização excessiva e fortalecer vínculos familiares e sociais.
Conclui-se que investir em educação parental é, ao mesmo tempo, um imperativo
ético, pedagógico e político. Ético, por reconhecer o direito da criança a uma
formação integral que considere seus contextos de vida; pedagógico, por oferecer
caminhos concretos para a superação de dificuldades de aprendizagem; e político,
por exigir do Estado e da sociedade o compromisso com práticas inclusivas que
combatam a cultura do fracasso escolar. Apenas com essa articulação será possível
transformar a escola em espaço de desenvolvimento pleno, capaz de acolher a
diversidade de trajetórias e de promover a equidade educacional.
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